Uma revista francesa, L'Illustration, publicou em 1905, a fotografia de um general japonês tirada numa trincheira, aberta nos arredores de Mukden, durante a guerra russo-japonesa. Uma foto que não deixou de surpreender já que nela, e ao contrário do que era a ideia em voga na altura, surgia um militar trajando um uniforme de estilo europeu, fumando e equipado com uns moderníssimos binóculos.
Uma imagem que alertava o mundo para o facto de o Japão dispor de um exército equipado com o mais moderno material e com o qual seria necessário, num futuro mais ou menos próximo contar num eventual conflito. O general Hideki Tojo - o homem que como militar e estadista arrastou o Japão para a Guerra no Pacífico na sequência de Pearl Harbor - é um dos produtos da renovação do exército nipónico.
Adido militar na Alemanha
Hideki Tojo nasceu em Tóquio a 30 de Dezembro de 1884, filho de uma família bem instalada na vida. Formou-se na Academia Imperial Militar com o posto de subtenente. Aos 35 anos, em 1919, Tojo é nomeado adido militar da Embaixada do Japão na Alemanha. Um destino que, um ano passado sobre o fim da Primeira Grande Guerra, não era o local mais apropriado para um jovem militar. Mesmo assim, Tojo aprendeu, com o que restava de um exército derrotado e quase desmantelado, muitas lições que lhe serviriam para o futuro. Para o seu e para o do seu país.
Em 1928 é nomeado comandante-chefe do I Regimento de Infantaria que, oito anos mais tarde, tomou parte activa no motim de 26 de Fevereiro. Foi nesses anos conturbados, em que um governo ultraconservador e vincadamente autoritário tentava por todos os meios travar o avanço da esquerda e dos movimentos pré-pacifistas, que Tojo assumiu o papel de primeiro plano e consolidou a sua carreira, tomando parte activa em quase todas as missões de repressão.
No ano seguinte, em 1937, é nomeado comandante do Quartel-General da Polícia e, pouco depois, assume a chefia do Estado Maior do Exército de Kuangtang, província chinesa integrada na Manchúria ocupada pelo Japão no decurso do conflito russo-nipónico de 1904-1905 e abandonada no final da Segunda Grande Guerra.
Presidente do governo
Em Julho de 1940, o príncipe Konoye oferece-lhe a pasta da Guerra no governo por si liderado. Fuminaro Konoye, descendente de uma influente família feudal, era visto no Ocidente como um individuo com ideias expansionistas cujos objectivos eram alcançados à custa da China. Dissolveu os partidos políticos, instituiu aquilo a que chamou de nova ordem para o Este da Ásia.
Faltou-lhe, todavia, um acordo com os Estados Unidos, fracasso que lhe custaria o lugar. A 16 de Outubro de 1941 Konoye é substituído pelo general Tojo na chefia do executivo que, de imediato, chama a si os objectivos da nova ordem e inicia a aproximação aos princípios defendidos pelos países que integram o Eixo. Konoye, que chegou a ocupar a vice-presidência do primeiro governo japonês do pós-Guerra, acabara por suicidar-se ao ser incluido na lista de criminosos de guerra.
Quanto a Tojo, senhor absoluto dos destinos do Japão, dá a ordem para o ataque contra Pearl Harbor. O dia 7 de Dezembro de 1941 - o dia da infâmia, como lhe chamou Roosevelt - marca o início da guerra contra os Estados Unidos da América.
Tojo passa a governar o país com mão-de-ferro, acumulando a chefia do governo com a do Estado Maior.
Dando luz verde aos planos da Marinha, as forças japonesas tomam Hong Kong a 25 de Dezembro, Manila cai a 2 de Janeiro de 1942, Singapura a 15 de Fevereiro e Java a 9 de Março. O ritmo da progressão japonesa apenas abranda na Birmânia, assistindo-se às primeiras derrotas do até então invencível exército nipónico, derrotado a 8 de Maio na batalha travada no Mar de Coral; a 5 de Junho em Midway. No ano seguinte as tropas nipónicas são obrigadas a retirar de Guadalcanal e, em Maio, têm de evacuar as Aluetas.
Durante este tempo, Tojo ia concentrando novos poderes nas suas mãos, criando um Ministério do Material de Guerra e substituindo a associação criada por Konoye por outra de assistência política ao Imperador (Yokusansejikai).
A máquina de guerra montada por Tojo começa a desmoronar-se a 15 de Junho de 1944, data que coincide com a conquista de Saipan, nas ilhas Marianas, pelas tropas comandadas por MacArthur. Esta conquista, que marca o fim da progressão norte-americana de ilha em ilha, permitirá aos Estados Unidos dispor de uma base para as super-fortalezas B-29 que lhes possibilita lançar ataques contra a capital nipónica.
Como se não bastassem os fracassos militares, Tojo via-se a braços com uma delicada situação social interna. A crescente falta de alimentos era dramática, obrigando a apertar o racionamento para limites próximos do mínimo indispensável à sobrevivência dos cidadãos. A idade de incorporação passou para os 17 anos. Medidas que não impediram nem a demissão de Tojo, a 22 de Julho de 1944, nem o aniquilamento do exército e da Marinha nipónicos. Os norte-americanos tomam, sucessivamente, as Filipinas, Iwo Jima e Okinawa. O golpe de misericórdia é dado com o lançamento das bombas atómicas de Hiroshima e Nagasaki.
Derrota e demissão
Demitindo-se, Tojo não admitira, nem moralmente, a derrota do Japão. A sua atitude foi apelar, sem medir as consequências da sua atitude, à continuação da guerra. Uma obstinação paga com vidas de concidadãos seus, sobretudo as dos que serviram de alvo às três bombas atómicas lançadas pelos norte-americanos. Mesmo assim, nada indicia que se outro tivesse sido o curso dos acontecimentos a guerra não se teria prolongado no tempo com maior sacrifício de vidas humanas. Essa é, aliás, uma das justificações avançadas pelo presidente Roosevelt para o ataque com armas atómicas contra o Japão, argumentando que a continuação das hostilidades com recurso exclusivo a armas convencionais iria custar a vida a centenas de milhares de soldados norte-americanos.
Quando abandona todos os seus cargos que ocupa, Tojo retira-se para sua casa e apenas se volta a ouvir o seu nome vários dias depois de MacArthur e Shigemitsu terem assinado os termos da rendição incondicional do Japão. Tojo, com o intuito de chamar a si a responsabilidade de todos os actos cometidos pelo seu país ao longo da guerra - libertando o imperador de toda e qualquer suspeita - decide suicidar-se. Não de maneira tadicional ( o harankiri) mas com um tiro. Uma tentativa que falhou mas, ainda assim, não o pouparia a um final trágico.
Tojo figurava na lista de cirminosos de guerra entregue a MacArthur com a recomendação de aplicar de forma exemplar e com o máximo de rigor as decisões constantes da Declaração de Potsdam. Na lista, ao lado de Tojo, figurava mais de uma centena de nomes, se bem que o número dos principais responsáveis estava limitado a 28, três dos quais já falecidos e um estava louco. Na lista dos 28 constava, obviamente, o nome de Hideki Tojo.
MacArthur, contudo, não partilhava dos princípios jurídicos em que assentava a figura de criminosos de guerra: O princípio de considerar criminosos de guerra os líderes políticos de uma guerra perdida era, para mim, repugnante. Considerei que tomar essa atitude violava os mais elementares princípios do direito criminal. Assim o pensava e isso mesmo deixei bem claro, sublinhando que a responsabilidade criminal deveria recair por inteiro nos responsáveis pelo ataque a Pearl Harbor, acção esta praticada sem a prévia declaração de guerra, como exigem o Direito Internacional e os costumes.
Julgamento e acusação
Com esta posição, MacArthur furtou-se a qualquer responsabilidade nos processos que se seguiram. No final do julgamento de Tóquio, cujas sessões se iniciaram a 3 de Maio de 1946, MacArthur deu ordens expressas para proibir que os fotógrafos captassem imagens da execução dos condenados à pena capital, alegando que uma decisão contrária poderia ofender a sensibilidade do povo japonês.
É este o motivo por que Hideki Tojo, considerado culpado de todas as acusações proferidas contra si e condenado à forca, não foi fotografado no patíbulo.
As últimas noites da sua vida foram passadas a escrever poemas - dentro da tradição romântica japonesa. Num deles, Tojo, então com 62 anos, depede-se da sua mulher com o seguinte verso: Espero por ti, flor de lótus, na outra margem.
Tojo nada tinha de um líder carismático nem, tão pouco, se distinguira, enquanto general, pelo seu heroísmo ou pela sua popularidade. Não seria nunca um Hitler ou um Mussolini. Limitava-se ao seu papel de general do Estado Maior, ambicioso mas demasiado formal. Ninguém pareceu ficar emocionado com a sua morte na forca nem, como sucedeu com outras figuras, se ergueu um mito em torno do seu nome. A única imagem que guardaram dele foi o ataque traiçoeiro contra Pearl Harbor no dia da infâmia.